Por Xico Graziano, com adaptações
Noutro dia, entrevistado no programa Canal Livre, da Band, o líder do MST, João Pedro Stédile, constrangeu seu interlocutor ao afirmar, contrapondo-o agressivamente, que os produtos transgênicos entopem a agricultura de agrotóxicos. O jornalista, surpreendido com a arrogância do economista, recolheu seu argumento.
Mas o jornalista estava correto.
Inúmeras pesquisas de campo, realizadas por entidades públicas, indicam que, efetivamente, ocorre redução dos pesticidas nas lavouras transgênicas. No Brasil e na Argentina, a soja configura o caso mais estudado. Na China, Índia e Austrália, o algodão se destaca nos estudos agronômicos. Basta consultar a Embrapa. Lá se encontra conhecimento técnico, não grito ideológico.
Este tipo de abordagem é também usado no caso de animais, sendo a mosca da fruta (em outros casos, a utilização de transgênicos é uma abordagem para a produção de determinados compostos de interesse comercial, medicinal ou agronômico, por exemplo). O primeiro caso público foi a utilização da bactéria E. coli, que foi modificada de modo a produzir insulina humana em finais da década de 1970. Um exemplo recente, já em 2007, foi o facto de uma equipe de cientistas conseguir desenvolver mosquitos bobucha resistentes ao parasita da malária, através da inserção de um gene que previne a infecção destes insectos pelo parasita portador da doença. Os investigadores esperam começar os testes de campo na África Sub-sariana dentro de aproximadamente 5 anos. No entanto, os casos mais mediáticos são os das plantas transgênicas, que são modificadas de modo a serem mais resistentes a pragas e doenças, por exemplo, ou a produzir substâncias que lhes permita resistir a insetos, nematóides ou vírus. A utilização deste tipo de organismos tem desencadeado, no entanto, acesas discussões acerca da sua segurança em termos ambientais e da saúde pública.
Existem no mercado dois tipos básicos de transgenias. Uma delas recebe a sigla Bt, iniciais da bactéria Bacilus thuringensis, fonte de bioinseticida utilizado há tempos na agricultura orgânica. Ingerida, a toxina bacteriológica contamina o aparelho digestivo de lagartas, liquidando-as. Pois bem. A engenharia genética conseguiu a proeza de introduzir no genoma das plantas o gene selecionado da bactéria. Resultado: quando a praga morde as folhas do algodão Bt, por exemplo, ela se intoxica naturalmente, sem precisar de inseticida que as mate. No Mato Grosso, lavouras convencionais de algodão recebem, em média, 15 pulverizações de inseticidas. Nas roças transgênicas, caem para 5 aplicações.
A segunda transgenia, mais discutida, incorpora nas plantas comerciais o gene RR, abreviatura de Roundap Ready. Trata-se, este, de um herbicida, cujo princípio ativo se chama “glifosate”. Sua molécula destrói a clorofila dos vegetais em geral, aniquilando-os. O deletério efeito, todavia, não funciona nas culturas que recebem, através da engenharia genética, o famoso gene.
Em conseqüência, nas variedades modificadas de soja, algodão ou milho, apenas uma aplicação desse herbicida, realizada após a emergência das sementes, acaba com o mato, sem prejudicar as plantinhas da lavoura. O campo fica limpo de ervas, restando verde apenas aquelas linhas onde germina a safra. O efeito é notável.
Os plantios convencionais recebem várias aplicações de herbicidas, dependendo do grau de infestação da área cultivada. E, normalmente, tais agrotóxicos, seletivos ou de “préemergência”, são mais contaminantes que o glifosate, utilizado nas lavouras transgênicas. Todos, por serem tóxicos, exigem o cuidado da receita agronômica.
Existe um "complicômetro", alardeado pelos críticos. A tecnologia RR pertence à Monsanto, conhecida como RR GA21 (tolerante ao herbicida glifosato), grande multinacional norte-americana, mesma empresa que fabrica o fungicida do Roundup Ready®. Óbvio está o risco de se criar danosa dependência do agricultor à garra monopolista do Tio Sam. Pode ser, mas há um senão.
A patente mundial do glifosate expirou em 2000, caindo para domínio público. À semelhança da medicina, vira produto genérico. Apenas no Brasil, atualmente, 18 empresas, nacionais e estrangeiras, fabricam 20 marcas comerciais do herbicida, todos com a mesma base química. Há, portanto, forte concorrência no mercado. A mentira ideológica omite a relevante informação.
A biotecnologia, incontestavelmente, trabalha a favor da redução dos pesticidas agrícolas. O fato, objetivo, recebeu o primeiro atestado oficial quando, em 2003, no processo de votação da Medida Provisória 131, o núcleo agrário do PT solicitou um relatório sobre a matéria. Visita em campo, relatada na Comissão de Agricultura, confirmava as vantagens agronômicas da nova tecnologia. Por isso os pequenos agricultores gaúchos a adotavam, contrabandeando-a da Argentina.
Foram, na época, arrolados 12 aspectos positivos. Incluíam a redução no uso de herbicidas, aumento na praticidade da lavoura, economia de combustível, redução de perdas e maior liberdade do trabalho rural. Anotava ainda o reaparecimento de pequenos mamíferos, aves e peixes nas redondezas dos campos de produção. “Um banho de realidade”, conforme se expressou a agrônoma Maria Thereza Pedroso, responsável pelo relatório petista.
Nem tudo está resolvido no mundo dos transgênicos. A Embrapa aponta que o manejo inadequado da Soja RR pode favorecer a manifestação da resistência de plantas daninhas ao glifosate, especialmente azevém e amendoim bravo. Para enfrentar o problema, bastante conhecido na agronomia , se recomenda a rotação de culturas. Essa mesma técnica serve para cultivos Bt, nos quais se observa ressurgência de algumas pragas, antes pouco relevantes. Com ou sem transgênicos, nada é definitivo na dinâmica da natureza.
Neste mês, o Conselho Nacional de Biosegurança ratificou decisão liberando o plantio comercial de nova variedade transgênica de milho, o Bt11. Mais importante, decidiu que a análise científica, no âmbito da CTNBio, será doravante definitiva, salvo casos de interesse nacional. Precaução sempre, obscurantismo nunca.
A engenharia genética causa compreensível receio na sociedade. Afinal, trata-se de manipulação da vida. Há limite ético a ser considerado, bem como posição religiosa a respeitar. Acima de tudo, exige-se segurança na saúde e no meio ambiente. A verborragia, contudo, nada garantirá. Somente a crença no conhecimento científico será capaz de vencer os desafios da produção e da tecnologia.
Um conselho. Desconfie dos que defendem os transgênicos qual panacéia, invocando a solução da fome no mundo. Eles representam o poder econômico. E fuja rápido daqueles que vociferam contra a biotecnologia. Estes adoram manipular, politicamente, a opinião pública. Ambos falseiam a verdade.
A virtude segue o caminho do meio.
A relação completa das publicações pode ser encontrada aqui
Ligações externas
(en)Informação detalhado sobre transgênicos e testes de transgênicos
(pt) Greenpeace - guia do consumidor
(pt) Plataforma Transgénicos Fora (Portugal)
(pt) Centro de Informação de Biotecnologia (Portugal)
(pt) Conselho de Fiscalização do Cumprimento da Lei de Transgênicos
(en) Supporting Biotechnology in Agriculture
(en) Biotechnology in Food and Agriculture
Fonte:
quinta-feira, 3 de julho de 2008
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